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domingo, 27 de fevereiro de 2011

As Últimas Flores para o Hospital - Cap. III (Funeral)

Custava-me tirar aquele vestido negro do roupeiro, bem como aquelas meias opacas igualmente negras. Calcei as minhas botas de eleição e vesti um sobretudo negro. Alcancei a minha mala que era mais clara de que toda a minha indumentária daquele dia. Erin seguia-me num choro compulsivo com roupa negra e com maquilhagem exageradamente disposta na sua pequena face pálida. Eric levou-nos até à capela mortuária em silêncio. Eu estava noutro mundo. A morte da minha mãe deveria estar-me a afectar mais do que o facto de eu descobrir que eu tinha família... mas isso não se verificava. Eu ansiava saber quem realmente era e quem realmente devia fazer parte da minha vida e, naquele momento não fazia. Erin estranhou todo o meu comportamento com ausência de lágrimas, uma vez que eu e a minha mãe não tínhamos propriamente uma ligação de mãe e filha. Tínhamos uma relação de irmãs, amigas. Éramos cúmplices uma da outra - eu contava-lhe todas as minhas inseguranças, todas as minhas derrotas e todas as minhas conquistas. Porém, ela contava-me todas as suas conquistas e derrotas amorosas, até porque a amizade feminina, para ela, era algo impossível, uma vez que todas as amigas que teve foram apenas por interesse.
- Blair... estás bem? - questionou Eric olhando-me através do espelho.
Abanei a cabeça afirmativamente e encostei a minha cabeça ao vidro gélido até que chegámos à capela mortuária. A chuva caía copiosamente deixando pequenas gotículas no meu cabelo.
Olhei à minha volta. Não esperava muita gente na cerimónia fúnebre. A minha mãe sempre teve mais inimigos do que amigos, uma vez que os familiares dos acusados judicialmente faziam, quase frente, uma vigília nocturna na noite anterior ao julgamento de modo a demover a racionalidade da temível e infalível advogada Barbara Copperfield Fielding, impossibilitando-me de ter um sono tranquilo. Ela costumava receber muitas ameaças de morte mas ria-se das cartas e queimavas num prato de prata que tinha sobre a sua mesa do escritório. Alegava saber que "a profissão exige disto. Sempre soube que iria ser assim." Na verdade nada nos aconteceu. Todas aquelas ameaças de morte, rapto e tudo o que pudesse nos afectar de forma maléfica nunca acabou por se verificar.
Detive-me à porta. Tinha medo de como iria reagir ao vê-la deitada num caixão. Eric, cavalheiro como sempre, deu-me o seu braço e conduziu-me até próximo dele. A capela estava repleta. Nunca pensei vê-la assim tão cheia. Mirei cada rosto, cada expressão e reconheci hipócritas do escritório que fingiam chorar quando a grande vontade era abrir uma garrafa de champanhe francês para festejar a sua morte. Era capaz de apontar cada cara que desejava a sua morte. Mesmo com a minha dor e sabendo que eu não era tão asna, tinham o descaramento de se dirigirem a mim e lamentarem-se continuamente, alegando ter uma enorme pena de ela ter partido tão cedo e que iriam incluí-la nas suas orações. Ao invés daquilo que eu costumava fazer e dizer, limitei-me a sorrir delicadamente de modo a esconder a minha raiva e a minha vontade de lhes apertar aqueles pescoços. Alguns dos seus clientes deram-me os pêsames com sinceridade... pelo que me emocionei. Os meus colegas e professores da Universidade apresentaram-se em peso. Num dos momentos de silêncio, reparei num homem que estava afastado de toda a multidão que se atropelava para me dar os pêsames e ver o semblante de minha mãe. Mirei-o com curiosidade. Os seus olhos pareciam inchados e vermelhos.
Aquele semblante fazia-me lembrar alguém que, simultaneamente o meu cérebro conseguia absorver e identificá-lo mas outra parte dele dizia-me que era um grande absurdo e que tudo não passava da minha imaginação demasiado fértil. Mas aqueles olhos verdes, aquela expressão facial... fazia-me lembrar alguém que eu conhecia... mas eu não conseguia obter a imagem real.
- Blair... - disse Erin fungando. - O que foi?
- Nada... nada... Hum... olha para aquele homem. - disse apontando tentando disfarçar. - Ele faz-me lembrar alguém... não te lembras dele?
Erin mirou-o.
- Hum... Lamento, mas não.... Se calhar foi um dos namorados da tua mãe. - disse.
- Se calhar... - concordei, enquanto olhava para o meu relógio de pulso. - Eles já vão levá-la, não é?
- Sim, Blair. Não tardará.
Voltei a olhar para o local onde o homem estava e já não o avistei. Procurei-o com os olhos mas não o vi. Levantei-me e disse a Eric que já vinha. Dirigi-me ao exterior, colocando a minha écharpe negra na cabeça. Subitamente, vi-o sentado debaixo de uma árvore a acartar com a chuva pelo corpo abaixo.
- O senhor sente-se bem? - indaguei. - Eu conheço-o?
O homem olhou para mim com os olhos encharcados. Apressou-se a limpá-los, não me fixando.
- Não. Provavelmente não. - respondeu numa voz baixa e serena
- Hum... É melhor vir para dentro. Vai apanhar uma constipação.
Ele olhou-me de soslaio e sorriu como se eu estivesse a dizer uma grande barbaridade. Fez-me lembrar a minha mãe.
- Há coisas piores que uma constipação. A menina é que devia voltar para o interior. Parece que não está completamente restabelecida. - disse enquanto se retirava da copa da árvore que o abrigava. Retirou as chaves do bolso e premiu o botão para abrir as portas do seu carro. Procurei logo qual era. Era um hábito que tinha desde criança, e cheguei à conclusão que se tratava de um reluzente Audi.
- Tem a certeza que não o conheço? - inquiri novamente.
- Não. Duvido que me conheça... - disse. - Já agora, os meus pêsames.
Sorri forçadamente e voltei para o interior com a sensação de já ter visto aquela cara em algum lado.
- Estás doida, Blair? Onde raio te meteste? - questionou Erin com os olhos muito arregalados.
- Fui lá fora. - disse não adiantando mais nada.
- Querem levantar o corpo. Não deixei. Pensei que quisesses te despedir dela.
Olhei-a muito fixamente. Mais difícil que vê-la definhar, era despedir-me dela. Eu não acreditava na vida depois da morte. Talvez fosse melhor acreditar, mas eu não era nenhuma bem-aventurada que acreditava nas coisas sem ver. Aproximei-me sempre com Erin e Eric do meu lado. Dei-lhe um beijo na testa gélida e afastei-me rapidamente. Queria que aquela imagem pálida se eclipsasse da minha mente.
 Ver aqueles carniceiros fecharem o caixão fez-me contrair uma crise de choro ininterrupta. Era como se lhe tivessem a tapar o Sol enquanto viva. Como se estivessem a obrigá-la a morrer.
Eu não consegui ir ao funeral. Ver os coveiros a encher o túmulo com terra, pessoas a deitarem flores e alguns dementes a colocarem terra no seu caixão com as mãos era de mais para mim.
Na minha cabeça passava-se um pequeno filme que imaginava que, no silêncio perturbador da noite quando todos se retirassem, os vermes iriam atacar o seu corpo e ela sofria debaixo daquela terra, soltando gritos dolorosos. E ninguém a podia ouvir... nem ajudar.
Eu sempre pensei que era forte. Que a morte era ultrapassável, mas não era... Quando nos vemos rodeados de pessoas, somos capazes de as espezinhar, de viver bem sem elas. Quando, abruptamente a sua presença se desvanece, chorámos essa ausência e basta essa pessoa faltar para parecer que já falta toda a gente. Basta faltar esse alicerce para o nosso mundo se desmoronar como se fosse um castelo de areia sujeito à meteorização e erosão do mar. E esse lugar nunca mais será ocupado. Ficará lá algo que indicia a falta de algo, assemelhando-se a um puzzle incompleto.
E eu sentia-me incompleta... órfã. Sem apoio. Eu tinha Erin e Eric mas ela fazia-me falta. O meu mundo estava danificado e não havia nada nem ninguém que o pudesse ocupar. Ela dizia que "o amor cura tudo". Cura. Quando existe. 

9 comentários:

Rita J. disse...

a sériioo? quais sao as tuas? *.*

Princesa Rebelde! disse...

não tens de quê, é verdade (:
beijinhos !

Rita J. disse...

a serio? tens de me oferecer umas (a)

Rita J. disse...

tas a brincar, certo? :pp

Cláudia M. disse...

Que lind Hayley ;p
Beijinhos grandes
E obrigada :)

lara beatriz disse...

Muito bom, continua. *-*
beijinho :*

Bruna Tschaffon disse...

seus textos estão a cada dia mais lindos!
comecei a te seguir no weheartit :)
beijinhos

lara beatriz disse...

talvez sintas isso por estares a escrever algo diferente. (:

Cláudia disse...

Gostooo *.*
mas quero cusquices x)

Beijinho <3